A fina dama

A fina dama
Fernanda Takai - a fina dama da mpb

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Cântico dos laços


És matéria, como sou
Da mesma matéria que és
Que dessa massa emergem conflitos
Dos labirintos por onde o tempo nos leva
Já te injuriei, hoje não o faço
E fui por ti jurado
Mas te vi chorar ao me ver num circuito de dor
Sei que era por amor
Fechei os olhos e fingi estar dormindo
Pensei que não existisse tal fraqueza
Não me decepcionei
Pois sou da mesma massa
Também fraquejo e choro
Queria tanto você e a rainha numa pessoa
que nem sempre víamos
Prantos foram derramados por esse desejo inerte
súplicas a Deus levantadas
Ah, meu querido velho
Depois de tanto tempo do meu natal
me provocas um forte amor por ti
tão grande como o pranto em que te vi
Caminhas lentamente em busca de tua fé, de um milagre
Saibas que aprendi contigo
muito do que tenho e sou
só fui tolo em resistir e ver isso
Da massa que tenho, tenho-a em ti
E agora, não te desconjuro
não tenho mais tempo nem idade pra isso
senão, para conhecer-te mais
Foi este estorvo que trazes
que me fez suplicar a Deus
por nosso afeto e nossas vidas
Olho para ti e me vejo
Dói ver minha massa amassada
Por algo que, se pudesse, arrancaria de ti
Mas, meu velho, o que dizer?
Somos massa de Deus
Ele sabe o que será
Essa é nossa conciliação
A prova da nossa aliança
Tudo que não entendia
se esclarece agora
eu paro no tempo pra fugir
mas também celebrar a vida e a Deus
que te fez e, te marcando, mexe conosco, nos inquieta
Voltas a ser uma criança
na qual me reconheço
e em parte desejo sê-la
Tempo feroz que não para
Deixa meu velho, eu paro
e ajoelho-me diante de ti, do teu sofrimento
para ver-te um herói
que errou muito, e acertou também
Nessa massa da qual saímos
a força que tinhas se dobra em mim
para dizer-te o que já me disseste timidamente
Amo-te, meu velho
Nesse estorvo parece está essa cura de nós
a maravilha do afeto de nossa casa.


Ao meu pai.

Anglebson Barros da Silva – setembro 2008

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Vida e rosa

A rosa que desabrocha
 
Os pés que calçam



Os espinhos que despontam



Os defeitos que se desenvolvem



A vaidade das pétalas



O orgulho de possuir algo, ou alguém



O tempo que não pára



Murcham as pétalas



Transparecem as rugas e os cabelos brancos



Seca-se e...



Envelhece-se e...



Morrem.


Anglebson Barros 01/01/11

AULA PARA SE ENSINAR A VIVER

Trabalhar é muito difícil
E pior que isso é se jogar de um edifício
Dificilmente sabemos de alguém que queira realizar esta última ação
Não há qualquer possibilidade de se fazer as duas ações de uma só vez
Ou trabalha, ou se joga
Difícil ofício de edificar edifícios
Da vida voraz
Da luta que não cessa
Do erro da letra da música
Da voz rouca das angústias
Dos nossos pedaços que a morte leva
Do que o tempo muda

Minha professora de Matemática costumava dizer
Que embora viver de amor seja muito dolorido
E morrer de amor não seja tão difícil
Sempre preferimos seguir vivendo
Sem fazermos planos de nos jogar de um edifício
Ela costumava mostrar isso nas aulas de Geometria
Traçando linhas para os lados, para cima e para baixo
Sempre tentando nos convencer a vivermos
Estudar sempre dar, vez por outra, uma vontade fugaz de se matar
Acho que ela tinha a noção exata disso
Pois era matemática, sabia um pouco sobre edifícios

Lembro das aulas e imagino os ofícios
Todos, ou quase todos, passam pela sala de aula
Ou escolhem um, entre muito ofícios
Ou se matam dos edifícios
Ou se perdem na Matemática
Eu não me perdi
Mas me confundi nas muitas linhas
E me achei algumas vezes no viés dos meus passos
Agora vivo
E minha função de viver é difícil
Inadequadamente faço nela construções
Que se reconstroem
Se desmancham
E assim faço os meus sentidos
E se me perco neles
Logo busco ou faço outros edifícios

Anglebson Barros – 17/12/2010